Fundamentos em doenças valvares – tudo o que você precisa saber sobre estenose mitral Episódio 2: sinais, sintomas e exame físico
Dra. Mariana Pezzutte Lopes
Estenose Mitral: sinais, sintomas exame físico
A estenose mitral (EMi) é uma valvopatia de evolução lenta e progressiva, na maioria das vezes consequência da febre reumática. A obstrução ao fluxo de enchimento do ventrículo esquerdo leva à elevação da pressão no átrio esquerdo, hipertensão pulmonar e, nas fases tardias, disfunção de ventrículo direito.
SINAIS E SINTOMAS
O quadro clínico reflete as alterações hemodinâmicas provocadas pela valva estenosada.
Dispneia
É o sintoma mais precoce e frequente decorrente do aumento da pressão venocapilar pulmonar. Manifesta-se inicialmente aos esforços, podendo evoluir para dispneia paroxística noturna e ortopnéia. Situações que aumentam o fluxo através da valva mitral ou reduzem o tempo de enchimento ventricular — como gravidez, fibrilação atrial, exercício, hipertireoidismo e infecção — precipitam ou agravam os sintomas.
Tosse seca e hemoptise podem ocorrer por congestão pulmonar e ruptura de pequenas veias brônquicas.
Dor torácica
Não é típica, presente em menos de 15% dos pacientes e, quando ocorre, costuma estar relacionada à hipertensão pulmonar severa e à sobrecarga do ventrículo direito.
Palpitações
Decorrentes, em geral, de fibrilação atrial (FA) — arritmia que se correlaciona com a idade e a gravidade da estenose. A dilatação do átrio esquerdo e a fibrose atrial favorecem o aparecimento da FA, com redução de até 20% do débito cardíaco e piora acentuada dos sintomas.
Fenômenos embólicos
Até 20% dos casos podem apresentar eventos embólicos sistêmicos, mesmo em ritmo sinusal. O átrio esquerdo dilatado favorece a estase sanguínea e a formação de trombos, especialmente em pacientes com episódios de FA paroxística. A estenose mitral é, portanto, uma condição de altíssimo risco tromboembólico, com mecanismo distinto de outras formas de FA, pois o trombo pode se formar fora do apêndice atrial esquerdo, em decorrência da estase global da cavidade.
Síndrome de Ortner (Cardiovocal)
Rara, mas clássica. Resulta da compressão do nervo laríngeo recorrente pelo átrio esquerdo dilatado, causando rouquidão e disfonia.
EXAME FÍSICO
O exame físico permanece uma ferramenta valiosa no diagnóstico clínico da estenose mitral, permitindo estimar a gravidade da obstrução valvar.
Bulha B1 hiperfonética
A primeira bulha é acentuada devido ao fechamento vigoroso das cúspides mitrais ainda flexíveis. Com a progressão da doença, a calcificação e imobilidade reduzem sua intensidade.
Estalido de abertura
Som de alta frequência que ocorre após a segunda bulha (B2), resultante do súbito tensionamento das cúspides mitrais ao abrir-se para o enchimento ventricular.
Quanto mais próximo da B2 estiver o estalido, mais grave é a estenose.
Sopro diastólico em ruflar
De baixa frequência, melhor audível com a campânula do estetoscópio no foco mitral (5º espaço intercostal esquerdo, em decúbito lateral).
A intensidade não se correlaciona com a gravidade, mas com a duração do sopro.
O reforço pré-sistólico está presente em ritmo sinusal e desaparece com FA.
Achados associados
– Hiperfonese de P2, quando há hipertensão pulmonar.
– Sopro de insuficiência tricúspide funcional, regurgitativo, que aumenta com a inspiração (manobra de Rivero-Carvallo).
– Sopro de Graham Steell, aspirativo, indicativo de insuficiência pulmonar secundária à hipertensão pulmonar importante.
– Em fases avançadas: ritmo irregular e sinais de insuficiência cardíaca direita (turgência jugular, hepatomegalia, edema).
Importante: não se espera insuficiência cardíaca esquerda na estenose mitral pura.
Se presente, deve-se investigar outras causas associadas, como insuficiência mitral concomitante, acometimento aórtico, cardite reumática ativa, taquicardiomiopatia ou isquemia miocárdica.
Por fim, podemos dizer que o reconhecimento dos sinais e sintomas da estenose mitral continua sendo essencial para o diagnóstico precoce e o manejo adequado.
Apesar dos avanços em métodos de imagem, a anamnese detalhada e o exame físico criterioso ainda fornecem pistas fundamentais sobre a gravidade da doença e o momento ideal de intervenção.
REFERÊNCIAS
– Diretriz Brasileira de Valvopatias – Arq Bras Cardiol. 2020;115(4):720–775.
– ESC/EACTS Guidelines for the Management of Valvular Heart Disease. Eur Heart J. 2021.
-Praz F, Borger MA, Lanz J, et al. 2025 ESC/EACTS Guidelines for the management of valvular heart disease. Eur Heart J. 2025;ehaf194.
– Otto CM, Bonow RO. Valvular Heart Disease. In: Braunwald’s Heart Disease, 12th ed.
Assista ao video
No segundo episódio da série Fundamentos em Doenças Valvares – tudo o que você precisa saber sobre estenose mitral, a Dra. Mariana Pezzute Lopes explica quais são os sinais, sintomas e exames físicos realizados para fechar o diagnóstico da condição.
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