Fundamentos em doenças valvares – tudo o que você precisa saber sobre estenose mitral Episódio 4: como fazer o diagnóstico ecocardiográfico
Maicon Felipe Ribeiro da Cruz
A estenose mitral é uma doença que se caracteriza por estreitamento do orifício valvar, que em adultos normais pode variar de 4 a 6 cm2. Em adultos, a etiologia da estenose mitral é em grande parte decorrente de cardiopatia reumática. Muitos pacientes com estenose mitral reumática não têm história conhecida de febre reumática, mas a morfologia da valva vista ao exame ecocardiográfico permite o estabelecimento de um diagnóstico de febre reumática antecedente. Outras causas menos comuns de estenose mitral incluem a calcificação do anel mitral, observada principalmente em pacientes idosos, a origem congênita (como a válvula mitral em “paraquedas”), o lupus eritematoso sistêmico e a doença carcinoide.
Os aspectos característicos da estenose mitral de origem reumática, à ecocardiografia bidimensional, incluem fusão comissural, espessamento e calcificação das cúspides valvares e do aparelho subvalvar. Observa-se também a típica abertura em “domo” ou “bastão de hóquei” (Figura 1) da cúspide anterior da valva mitral durante a diástole, especialmente nos cortes paraesternal longitudinal e apical. O átrio esquerdo geralmente encontra-se aumentado. No plano transversal, ao se visualizar a valva mitral de frente, é comum identificar o aspecto característico de abertura em “boca de peixe”.

Figura 1 – Janela paraesternal eixo longo ilustrando a cúspide anterior mitral (a) em aspecto de bastão de hóquei (b).
Vale ressaltar que em pacientes com estenose importante, principalmente aqueles candidatos à valvoplastia por cateter-balão, deve-se sempre descrever os critérios ecocardiográficos de Wilkins-Block. Esse escore avalia o grau de lesão imposta pela agressão reumática à valva mitral, por meio da avaliação ecocardiográfica com ênfase na descrição dos aspectos estruturais. São considerados quatro parâmetros: mobilidade dos folhetos, espessamento valvar, grau de calcificação e acometimento do aparato subvalvar. Cada item recebe uma pontuação de 1 a 4, resultando em um escore total que pode variar de 4 a 16 pontos. Pacientes com escore de Wilkins-Block igual ou inferior a 8 são considerados bons candidatos à valvoplastia mitral por cateter balão, desde que não haja outras contraindicações.
Em relação à quantificação da gravidade da estenose mitral, a área valvar pode ser aferida por meio da planimetria (Figura 2) da circunferência interna da valva, no plano paraesternal transversal, no ponto de abertura máxima das cúspides, durante a diástole média. Esse método é o mais recomendado para estimar a área da valva mitral, embora apresente limitações em pacientes com valvas intensamente calcificadas ou que já tenham sido submetidos previamente à comissurotomia.

Figura 2 – Janela paraesternal eixo curto ilustrando a planimetria de uma valva mitral estenótica (no exemplo com área de 0,73cm2)
Uma alternativa para a medida da área valvar é a avaliação hemodinâmica pelo Doppler contínuo, que quantifica a estenose por métodos como tempo de meia pressão (conforme a fórmula, área valvar mitral em cm2 = 220/PHT) ou pela equação de continuidade. Conforme as atualizações da diretriz brasileira de valvopatias de 2020, classifica-se como estenose mitral anatomicamente importante aquela com área valvar menor que 1,5cm2 e/ou gradiente diastólico maior ou igual a 10mmHg.
É pertinente destacar que a ecocardiografia permanece como o método preferencial para a avaliação de pacientes com estenose mitral. No entanto, é importante ressaltar que alterações no tempo diastólico ou no estado volêmico podem influenciar o gradiente transvalvar mitral, dificultando a análise precisa da gravidade da estenose. Dessa forma, torna-se necessária uma estreita correlação com a avaliação clínica, considerando complicadores como a fibrilação atrial de início recente e hipertensão pulmonar e, quando indicado, a complementação com outros exames, incluindo o estudo hemodinâmico invasivo.
Referências:
1 – ARMSTRONG, William F.; RYAN, Thomas. Feigenbaum – Ecocardiografia. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. ISBN 978-85-277-1842-4.
2 – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Atualização das Diretrizes Brasileiras de Valvopatias – 2020. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 115, n. 4, p. 720–775, 2020. DOI: 10.36660/abc.20201047. Disponível em: https://abccardiol.org/article/atualizacao-das-diretrizes-brasileiras-de-valvopatias-2020/
3 – MATHIAS JR., Wilson. Manual de ecocardiografia. 3. ed. São Paulo: Manole Saúde, 2013. ISBN 978-85-204-3700-1.
Assista ao video
No quarto episódio da série Fundamentos em Doenças Valvares – tudo o que você precisa saber sobre estenose mitral, o Dr. Maicon Cruz explica como fazer o diagnóstico ecocardiográfico da patologia.

O Triple I - InCor Innovation in Intervention
O Triple I - InCor Innovation in Intervention
O Triple I - InCor Innovation in Intervention
O Triple I - InCor Innovation in Intervention
O Triple I - InCor Innovation in Intervention
O Triple I - InCor Innovation in Intervention 

O Triple I - InCor Innovation in Intervention
Deixe uma resposta
Quer juntar-se a discussão?Fique à vontade para contribuir!