Fundamentos em doenças valvares – tudo o que você precisa saber sobre endocardite infecciosa Episódio 2: novas tendências nos perfis clínico e etiológico
Dr. João Ricardo Fernandes
A Endocardite Infecciosa (EI) tem acometido, nos últimos anos, pacientes progressivamente mais idosos, os quais apresentam, como fatores predisponentes, valvopatias degenerativas (como estenose aórtica e insuficiência mitral), dispositivos intracardíacos (marcapasso, cardiodesfibrilador implantável, dispositivos de assistência circulatória) e cateteres de longa permanência. Pacientes com múltiplas comorbidades, assim como os imunossuprimidos, também têm apresentado maior incidência de EI.
Além disso, com o aumento do emprego de dispositivos de implante transcateter — principalmente o TAVI (implante transcateter de prótese aórtica), mas também procedimentos como o fechamento de defeitos septais e de apêndice atrial (estes com maior risco nos primeiros seis meses após o implante) — novas populações sob risco de EI têm sido identificadas.
A despeito da longa história da EI e dos avanços no seu diagnóstico e tratamento, ainda há dificuldades significativas em sua abordagem. Manifestações atípicas e quadros subagudos são cada vez mais frequentes, assim como a presença de microrganismos com maior resistência antimicrobiana. Por esses motivos, o primeiro passo para mitigar o subdiagnóstico é manter um alto grau de suspeição clínica. Por ser uma patologia de apresentação variada e caracterizada por sinais e sintomas inespecíficos — muitos dos quais compartilhados por doenças reumatológicas, neoplásicas, neurológicas, autoimunes, entre outras —, a suspeita clínica é imprescindível para que se empreguem técnicas de diagnóstico precoce e adequado. O caminho diagnóstico, por sua vez, é constituído por dois grandes pilares: microbiológico e por imagem.
Quanto ao perfil microbiológico, atualmente, os principais microrganismos causadores de EI são o Staphylococcus aureus, os estreptococos orais e os estafilococos coagulase-negativos. Particularmente na população idosa, o Enterococcus faecalis também tem ganhado destaque.
Algumas décadas atrás, em nosso meio, os Streptococcus sp. destacavam-se como principais causadores de EI, especialmente em jovens portadores de doença valvar reumática. Todavia, com a mudança no perfil epidemiológico e o aumento dos casos associados aos cuidados de saúde (estimados em até 25% do total), os Staphylococcus sp., incluindo cepas resistentes, e germes gram-negativos têm sido cada vez mais identificados em hemoculturas de pacientes com diagnóstico de EI.
Com o aumento da incidência de EI causada por germes mais agressivos e resistentes, complicações embólicas também têm sido frequentemente observadas, destacando-se a importância da busca ativa por focos de acometimento extracardíaco, tanto para auxiliar no estabelecimento do diagnóstico quanto para definição do prognóstico e da melhor estratégia terapêutica.
Cabe destacar que uma porcentagem variável dos casos — que pode chegar a 10% — está associada a hemoculturas negativas. Os principais motivos incluem o uso prévio de antibióticos (muitas vezes de forma desnecessária), EI causada por fungos ou por bactérias de crescimento difícil em meios de cultura, as chamadas fastidiosas. Para a adequada identificação desses agentes, deve-se recorrer a testes sorológicos (Coxiella burnetii, Bartonella spp., Aspergillus spp., Mycoplasma pneumoniae, Brucella spp., Legionella pneumophila), ou a ensaios de reação em cadeia da polimerase (PCR), técnica que permite a amplificação de sequências específicas de DNA — útil para germes como Tropheryma whipplei e Bartonella spp.
Essas mudanças nos perfis clínico e microbiológico da EI reforçam a importância de uma abordagem diagnóstica completa, precoce e personalizada, com o objetivo de garantir tratamento eficaz e melhores desfechos aos pacientes.
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Você sabe identificar os perfis clínico e etiológico da endocardite infecciosa?
Apesar de ter um perfil pré-estabelecido, ele tem mudado nos últimos anos e o Dr. João Ricardo Fernandes explica sobre o assunto no segundo episódio da série Fundamentos em Doenças Valvares – tudo o que você precisa saber sobre endocardite infecciosa.
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