Estenose Mitral de baixo gradiente

Tiago Bignoto

A estenose mitral reumática é caracterizada pela fusão das comissuras da valva mitral gerando uma maior dificuldade do sangue passar do átrio esquerdo para o ventrículo esquerdo durante a diástole. Isso gera um aumento de pressão no interior do átrio esquerdo não só pela impedância criada pela valva mitral, mas também pela inabilidade do ventrículo que pode apresentar sério acometimento do aparato subvalvar e disfunção tanto sistólica, quanto diastólica.

A classificação da gravidade da estenose mitral se dá pela área valvar, que quando abaixo de 1,5cm2 é considerada grave. Nesse cenário, o gradiente é extremamente lábil a depender de alterações fisiológicas como pré-carga, frequência cardíaca e complacência do ventrículo esquerdo.

Diversos estudos mostram que indivíduos que tenham desenvolvido estenose mitral reumática importante, mas que apresentam gradiente médio diastólico baixo (<10mmHg) apresentariam menor resposta, no tocante a sintomatologia, quando submetidos a valvoplastia mitral percutânea. Entendendo um pouco mais a fisiopatologia desses pacientes, viu-se que eles compartilhavam diversas alterações semelhantes aos portadores de estenose aórtica paradoxal, como elevada impedância ventrículo-arterial, elevada incidência de FA e redução da complacência ventricular, nesse caso, por acometimento do subvalvar. A FEVE também se mostrou reduzida, embora ainda dentro da normalidade, mas o componente de contratilidade instrínseca (como o strain), estava preservado. Seriam esses pacientes portadores de uma pseudo-estenose mitral? Seriam os sintomas originários das demais alterações em detrimento da estenose mitral anatômica? Em países mais desenvolvidos, a prevalência de jovens com estenose mitral reumática vem caindo e ficaram os casos em pacientes que agora são mais idosos. Nesse cenário, muitos deles desenvolvem comorbidades que levam a situações de insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada e isso pode estar levando a uma confusão diagnóstica referente aos sintomas expressados por esses indivíduos. Assim, muitas vezes é impossível entender se o stroke volume desses pacientes é baixo devido a obstrução mitral ou devido a elevada pós-carga associada a uma complacência ventricular diminuída e a FA que ocasiona uma perda de aproximadamente 25% do débito cardíaco. Em resumo:

  • Talvez um ecocardiograma de esforço seja indicado nos casos de estenose mitral com baixo gradiente a fim de observar se há elevação dos gradientes diastólicos pela valva, o que poderia indicar que a valvoplastia irá trazer benefícios.
  • Talvez o método ecocardiográfico atual, que se baseia na área valvar funcional, não seja o melhor método para estratificar esse tipo de paciente, visto que há clara influência de diversos outros fatores como impedância ventrículo-arterial, complacência de ventrículo esquerdo, presença de fibrilação atrial, etc.
  • Podemos estar diante de um novo subtipo de estenose mitral, a pseudo-estenose mitral grave, que deveria ter tratamento diferente do que fazemos hoje tradicionalmente.

Estenose mitral reumática em pacientes com idade mais avançada pode ser um grande desafio diagnóstico na questão da sintomatologia.

Referência

1 – El Sabbagh A, Reddy YNV, Barros-Gomes S, et al. Low-Gradient Severe Mitral Stenosis: Hemodynamic Profiles, Clinical Characteristics, and Outcomes. J Am Heart Assoc. 2019 Mar 5;8(5):e010736.

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