Quando devo “medir o cálcio” da valva aórtica?
Tiago Bignoto
Com o envelhecimento da população a estenose aórtica vem aumentando sua prevalência (população com mais de 65 anos tem uma prevalência de 2-7%). Os fatores de risco associados mais comuns são idade, tabagismo, hipercolesterolemia, diabetes e hipertensão arterial sistêmica. A degeneração calcífica dos seus folhetos faz parte da fisiopatologia e sua taxa de evolução tem relação direta com a piora progressiva da estenose.
Tem como manifestações clínicas dispneia, insuficiência cardíaca, palpitação, dor torácica, síncope e morte súbita.
A estenose grave sintomática é uma indicação de troca da válvula aórtica e o momento cirúrgico adequado é crucial para uma melhor evolução pós-operatória e para prevenir desfechos futuros.
Assim como o escore de cálcio coronariano, a tomografia cardíaca consegue estimar a quantidade de cálcio na valva aórtica. Foi visto na literatura que quando o valor do escore foi comparado aos gradientes cavitários pelo cateterismo, houve boa correlação com os graus de estenose. São utilizadas algumas técnicas para medir o escore, como massa, volume, mas o mais utilizado é o Agatston.
O método mais utilizado para avaliar o grau de estenose (área, gradientes, velocidade máxima) ainda é o ecocardiograma. Caroline Cueff et al. comparou a tomografia com o ecocardiograma em relação a calcificação x gravidade hemodinâmica, inclusive em um subgrupo de pacientes com fração de ejeção reduzida (low flow/low gradient). Neste trabalho o valor de corte ideal encontrado foi de 1651 UA (unidades arbitrárias) com sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo de respectivamente 95%, 89%, 97% e 80% em pacientes com função ventricular preservada. Valores muito semelhantes foram encontrados também na presença de baixo fluxo.
Outros trabalhos observaram que na mulher para uma mesma gravidade da lesão valvar, um menor valor de escore de cálcio foi encontrado. Nesse subgrupo, o valor do escore de cálcio (Agatston) de aproximadamente 1200 AU teve uma sensibilidade de 89% e especificidade de 81% para estenoses valvares severas. Já nos homens, o valor encontrado foi de aproximadamente 2000 AU para mesma avaliação.
Além disso, o escore de cálcio se mostrou um preditor independente de eventos clínicos após ajuste para os preditores tradicionais de idade, sexo, velocidade transvalvar máxima e área valvar. Inclusive entre o subgrupo de pacientes com disfunção ventricular e redução no fluxo transvalvar.
Com o crescimento da disponibilidade, a análise do escore de cálcio pela tomografia deve ser usada como um exame de imagem complementar, particularmente nos pacientes com sintomas e medidas ecocardiográficas discordantes, ou com severidade questionável da doença.
Criam-se aqui alguns apontamentos:
- Importante lembrar que esta aquisição não requer contraste e envolve baixa exposição à radiação.
- A área valvar também pode ser avaliada pela tomografia de múltiplos detectores através da planimetria. Algumas publicações demonstram excelente correlação entre ecocardiografia e tomografia nesse quesito.
- Podemos lançar mão da tomografia para analisar a calcificação valvar aórtica e complementar os achados do ecocardiograma, principalmente em casos de exames discordantes, pacientes com janela acústica inadequada e naqueles com os variantes de estenose aórtica.
- Referência:
- 1- Baumgartner H Chair, Hung J Co-Chair, Bermejo J, Chambers JB, Edvardsen T, Goldstein S, et al. Recommendations on the echocardiographic assessment of aortic valve stenosis: a focused up date from the European Association of Cardiovascular Imaging and the American Society of Echocardiography. Eur Heart J Cardiovasc Imaging. 2017 Mar 1;18(3):254-275.
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