Endocardite Infecciosa: O Tratamento É Sempre Cirúrgico?
Fernanda Tessari
O tratamento cirúrgico da endocardite durante a fase ativa da doença está associado a maior risco e, portanto, é indicado apenas em situações específicas envolvendo possíveis complicações a despeito do tratamento com antibióticos. Idealmente a cirurgia deve ser realizada de forma eletiva após 1 ou 2 semanas de antibioticoterapia, porém em alguns casos não deve ser postergada. Neste cenário, pode ser necessária em caráter de emergência (dentro de 24 horas) ou urgência (em até 7 dias da apresentação).
A insuficiência cardíaca é a complicação mais comum, principalmente quando acomete a válvula aórtica, e consiste na principal recomendação de tratamento cirúrgico. Neste contexto, podemos ter duas situações:
- Disfunção valvar aguda ou fístula levando a edema pulmonar refratário ou choque cardiogênico, quando a cirurgia de emergência é recomendada;
- Disfunção valvar importante provocando sintomas de insuficiência cardíaca ou sinais ecocardiográficos de má tolerância hemodinâmica, como sinais de aumento da pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (ex: fechamento prematuro da mitral), aumento da pressão atrial ou hipertensão pulmonar moderada a importante. Neste caso, indica-se cirurgia precoce.
A evolução do processo infeccioso deve ser constantemente monitorizada por meio de avaliação clínica, exames laboratoriais, eletrocardiograma e exames de imagem, sendo indicada cirurgia nos seguintes cenários:
- Infecção localmente não controlada, com extensão perivalvar, levando a formação de abscesso, bloqueio atrioventricular total, pseudoaneurisma, fístula, aumento da vegetação;
- Infecção causada por fungos ou bactérias multirresistentes;
- Febre e hemoculturas persistentemente positivas a despeito do uso adequado de antibióticos por tempo prolongado (mais que 5-7 dias) e após a exclusão de focos infecciosos por embolização (abscesso esplênico, cerebral, renal);
- Endocardite de prótese valvar causada por estafilococo ou bactérias Gram-negativas não-HACEK
Além disso, em endocardite de próteses valvares, pode ocorrer recorrência de bacteremia após tempo prolongado de antibioticoterapia (ou após hemoculturas negativas) em decorrência da não completa esterilização do material protético. Nestes casos, a cirurgia também está indicada.
Já em relação à prevenção de eventos embólicos, a decisão por cirurgia deve levar em consideração a ocorrência de eventos embólicos, tamanho e mobilidade da vegetação, microorganismo envolvido e risco cirúrgico do paciente. O tratamento cirúrgico é indicado após um ou mais eventos embólicos apesar da antibioticoterapia adequada, especialmente se persistência de vegetações > 10 mm. Também pode ser considerada a realização de cirurgia precoce em casos de vegetações aórticas ou mitrais > 10 mm associadas a disfunção valvar importante e paciente de baixo risco cirúrgico, ou se vegetações > 30 mm em válvulas esquerdas, devido ao alto risco embólico. No caso de embolização cerebral com hemorragia intracraniana, deve-se postergar a cirurgia em ao menos 4 semanas.
Outro ponto importante é que no caso de endocardite de dispositivos cardíacos eletrônicos, todo o dispositivo cardíaco, incluindo cabos e gerador, deve ser removido.
A avaliação do caso por um time de endocardite, incluindo cardiologista clínico, cirurgião cardíaco, infectologista, ecocardiografistas e outros especialistas em imagem, é fundamental para a definição da abordagem cirúrgica e o melhor momento para realizá-la.
Referências
Referência
2020 ACC/AHA Guideline for the Management of Valvular Heart Disease
2015 ESC Guidelines for the management of infective endocarditis
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