Quando abordar insuficiência tricúspide isolada?

Pâmela Cavalcante | Vitor Emer Egypto Rosa

Historicamente conhecida como “a válvula esquecida”, a insuficiência da válvula tricúspide, por muito tempo, foi negligenciada. Dentre as razões apontadas, destacamos a alta mortalidade pós-operatória que se assemelha a dos pacientes mantidos em tratamento clínico. De fato, as indicações de abordagem de insuficiência tricúspide (IT) isolada até hoje são restritas e, muitas vezes, ocorrem tardiamente, quando a doença já está muito avançada, o que contribui para os resultados desfavoráveis.

Atualmente, com o desenvolvimento de técnicas de intervenção percutânea, voltamos novamente nosso foco para esta doença, que tem alta prevalência em idosos, chegando a acometer até 15% da população.

Consideramos IT isolada, aquela que apresenta-se sem a concomitância de  doença do coração esquerdo ou hipertensão pulmonar. Geralmente, é considerada uma doença primária da válvula, com dilatação do anel e alteração anatômica das cúspides, mas ela pode ter também um aspecto funcional relacionado a fibrilação atrial ou até mesmo devido a presença de fios de marca-passo. Outra causa importante de IT isolada é aquela que evolui de forma progressiva e tardiamente após correção cirúrgica de valvopatias esquerdas em que a tricúspide não foi abordada conjuntamente.

De acordo com as diretrizes atuais, a indicação de intervenção de IT isolada é uma exceção, ficando restrita a pacientes sintomáticos, refratários ao tratamento clínico, na ausência de disfunção ventricular direita e de hipertensão pulmonar importantes. O momento ideal de indicar a abordagem desses pacientes é bastante controverso, já que as características da IT são o grande período de latência até a manifestação dos sintomas de insuficiência cardíaca direita e a boa resposta ao tratamento clínico com diureticoterapia. Além disso, outro ponto crucial é a dificuldade em estratificar adequadamente o risco cirúrgico destes pacientes, já que a maioria dos pacientes é idosa, com múltiplas comorbidades e os escores de risco atualmente disponíveis não contemplam a abordagem da tricúspide isoladamente. Para tanto, foi proposto o TRI-SCORE, uma calculadora de risco para pacientes com IT isolada com indicação de abordagem cirúrgica. Porém, mais estudos são necessários para utilização desta ferramenta de forma rotineira. Nesses casos de maior complexidade, o Heart Team ainda tem um papel fundamental na indicação do melhor tratamento.

Novos estudos com enfoque na intervenção percutânea da IT isolada estão em andamento. Para pacientes com idade avançada e risco cirúrgico proibitivo, sintomáticos e refratários ao tratamento clínico, temos disponível o implante heterotópico de bioprótese bicaval (implante de bioprotese transcateter na cava inferior e superior), que mostrou resultados favoráveis para controle de sintomas e melhora de qualidade de vida. Outros dispositivos promissores para abordagem de IT estão sendo estudados, como o TriClip (reparo transcateter edge-to-edge), porém ainda não estão disponíveis e não foram aprovados para uso no Brasil.

  • Referências:
    • Izumi C. Isolated functional tricuspid regurgitation: When should we go to surgical treatment? J Cardiol. 2020 Apr;75(4):339-343. doi: 10.1016/j.jjcc.2019.11.001. Epub 2019 Nov 29.
    • Tarasoutchi F. et al. Update of the Brazilian Guidelines for Valvular Heart Disease – 2020. Arq Bras Cardiol. 2020 Oct;115(4):720-775.
    • Dreyfus J. et al. TRI-SCORE: a new risk score for in-hospital mortality prediction after isolated tricuspid valve surgery. Eur Heart J. 2022 Feb 12;43(7):654-662.
    • Estévez-Loureiro R, et al. A. 6-Month Outcomes of the TricValve System in Patients With Tricuspid Regurgitation: The TRICUS EURO Study. JACC Cardiovasc Interv. 2022 Jul 11;15(13):1366-1377.

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