Como fazer diagnóstico da Endocardite Infecciosa

Fernanda Tessari

A suspeição de endocardite infecciosa se dá a partir da interpretação conjunta da história clínica, achados laboratoriais e exames de imagem.

A depender do agente etiológico e do status clínico do paciente, pode apresentar-se na forma aguda, com destruição valvar e insuficiência cardíaca, ou subaguda, com febre baixa e sintomas constitucionais inespecíficos. Febre é o sintoma mais comum (mais de 90% dos casos), e é frequente a presença de sopro cardíaco. Pode também apresentar fenômenos vasculares e imunológicos, classicamente descritos. Anemia, leucocitose e provas inflamatórias elevadas também estão presentes na maioria dos casos.

A coleta de hemoculturas é fundamental para o diagnóstico etiológico e para guiar a terapia antibiótica. Recomenda-se a coleta de 3 pares de hemoculturas de sítios diferentes, com intervalo de 30 minutos entre elas. Entretanto, em parcela considerável dos casos, as hemoculturas são negativas devido ao uso prévio de antibióticos, infecção por fungos ou bactérias que requerem culturas especializadas, testes moleculares ou sorologias, como Coxiella burnetii e Bartonella pertussis, especialmente se epidemiologia compatível.

O exame de imagem inicial em todo caso suspeito para endocardite é o ecocardiograma transtorácico. Em casos de próteses valvares e dispositivos intracardíacos ou se alta suspeita clínica e exame inicial não diagnóstico, deve ser realizado o ecocardiograma transesofágico. A tomografia computadorizada é útil especialmente para avaliação de complicações, como abscessos, pseudoaneurismas e embolizações. Na endocardite de prótese valvar ou dispositivos, a realização de 18F-FDG PET-CT também pode auxiliar o diagnóstico.

A realização de procedimentos com risco de bacteremia (procedimentos gastrointestinais, genitourinários, respiratórios e, principalmente, odontológicos com manipulação de mucosas) deve levantar suspeita, principalmente se associada à presença de algum fator predisponente.

Utilizamos como ferramenta diagnóstica os Critérios de Duke Modificados, incluindo as atualizações mais recentes propostas pela European Society of Cardiology (Tabela 1).  Entretanto, caso o paciente não preencha tais critérios, mas persista suspeição clínica, recomenda-se repetir as hemoculturas, o ecocardiograma e demais exames de imagem. Em alguns casos o diagnóstico definitivo é feito apenas com a avaliação histológica do tecido valvar ou fragmentos embólicos, considerada o padrão-ouro para o diagnóstico.

Tabela 1. CRITÉRIOS DE DUKE MODIFICADOS
Critérios Maiores
Hemoculturas positivas

Agentes típicos de endocardite em 2 amostras distintas (Streptococcus viridans, Streptococcus bovis, bactérias do grupo HACEK, Staphylococcus aureus, enterococos adquiridos na comunidade na ausência de outro foco infeccioso primário; ou

Microorganismos consistentes com endocardite, com hemoculturas persistentemente positivas (≥2 hemoculturas positivas com > 12h de intervalo de coleta entre elas, ou 3 amostras positivas, com intervalo entre a primeira e a última de pelo menos 1 hora; ou

Uma amostra positiva para Coxiella burnetii ou sorologia reagente com IgG > 1:800

Imagem positiva

Ecocardiograma com vegetação, abscesso, fístula, pseudoaneurisma, perfuração da válvula ou folheto de prótese ou nova deiscência parcial de prótese valvar

Presença de lesões paravalvares na TC

Alteração no local de implantação de válvula protética no PET-CT ou na cintilografia com leucócitos marcados (apenas se prótese implantada há mais de 3 meses)

Critérios menores
Fatores predisponentes

Uso de substâncias intravenosas, imunossupressão, doença valvar ou cardiopatia congênita pré-existente, prótese valvar ou dispositivos intracardíacos, acessos vasculares profundos de longa permanência

Febre > 38oC
Fenômenos vasculares

Eventos embólicos arteriais periféricos e viscerais, como infarto esplênico

Lesões de Janeway (pequenas lesões indolores eritematosas ou hemorrágicas nas palmas das mãos e planta dos pés)

Hemorragia conjuntival

Aneurisma micótico hemorragia intracraniana

Fenômenos imunológicos

Nódulos de Osler (pequenas elevações dolorosas na face anterior da ponta dos dedos)

Manchas de Roth (manchas retinianas hemorrágicas com centro esbranquiçado)

Fator reumatoide positivo

Glomerulonefrite

Evidencia microbiológica

Hemoculturas positivas, mas que não preenchem os critérios maiores (exceto amostra única positiva para estafilococos coagulase-negativo ou microorganismos que não causam endocardite)

Diagnóstico
Endocardite definitiva

●2 critérios MAIORES ou

●1 MAIOR e 3 MENORES ou

●5 MENORES ou

Endocardite provável

●1 critério MAIOR e 1 MENOR ou

●3 critérios MENORES

 

Endocardite rejeitada

●Outro diagnóstico definitivo;

●Nenhuma evidência patológica de endocardite infecciosa na análise histopatológica, com terapia antibiótica ≤4 dias;

●Resolução dos sintomas com antibióticos por menos de 4 dias;

●Não preenche os critérios de endocardite provável

Referências:

  1. ESC Guidelines for the management of Infective Endocarditis (2015)
  2. Infective Endocarditis in Adults: Diagnosis, Antimicrobial Therapy and management of Complications, AHA/ACC (2016)

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